Thursday, November 6, 2014

Reflexões de uma Mãe na sala de espera de um hospital: Encontrando melodia em meio ao sofrimento

"...para mostrar nos séculos vindouros a suprema riqueza da sua graça, pela sua bondade para conosco em Cristo Jesus" (Efésios 2:7).


O céu ainda estava estrelado, a aurora ainda não mostrara sua graça, precisamos sair bem cedo a fim de não pegarmos trânsito na ponte em Florianópolis e não perdermos o horário previsto para a cirurgia de calcanhar, de nosso filho Esdras.

Chegamos em frente ao Hospital Celso Ramos, por volta das 6:00 horas da manhã de uma terça-feira. O ar estava pesado, ainda que a brisa soprava levemente o seu frescor. Era uma cirurgia delicada, ele havia quebrado o calcanhar em oito lugares, ao cair de uma escada, cerca de 4 metros de altura.

Novamente em um hospital, mais uma vez na sala de espera, aguardando resultados, outra vez a angustia invadindo nossa alma. Dessa vez a vítima não era mais o marido e sim um filho, que aguardava o milagre. O cenário era de dor, fomos os protagonistas e não havia vilão nessa história. Nossos corações apertados dentro de nossos peitos, o pavor nos aterrorizava, procuramos no sorriso um pouco de alento e como o restolho de uma cana espremida, para produzir um suco espesso e suculento, sentimo-nos.

Enquanto ainda dentro do carro procurávamos descansar um pouco, antes da hora marcada, rompeu-se em meio os arbustos do hospital, o cântico do sabiá poca. Como poderia uma ave em sua bestialidade, cantar no meio de tanta adversidade e dor? A natureza por ventura não sentira o nosso dissabor?

Ele estava lá, nos mostrando no cântico do sabiá, que Ele governa e que é possível sim, colocar melodia na música da vida. As adversidades são apenas arranjos, que tornam nosso cântico expressivo e sinfônico. O sabiá estava encoberto pelas folhagens e gravetos, não conseguíamos vislumbrá-lo, mas podíamos ouvir seu cântico, era pequeno em relação a tantos ruídos e lamentos, mas conseguiu aplausos e as árvores e os outeiros batiam palmas. Que cenário magnífico!

Depois encontramos o João de Barro, que construíra seu ninho junto as paredes sem cor, desgastadas pelo tempo, em um hospital. Entre as janelas que resguardavam histórias de dor, João construíra seu habitat de barro.

Aí nesse momento, me lembrei, que somos vasos de barro e muitas vezes o plano de fundo de nossa existência não é o que planejamos, nem muito mesmo almejamos, mas temos que aceitá-lo e construirmos nosso próprio refúgio.

Olhei para as árvores ao derredor e notei que eram de todas as cores, espécies e idades. Haviam árvores alaranjadas, esverdeadas, rosadas, amarronzadas e acinzentadas. Haviam árvores velhas podadas, brotos que cresciam à sobra de outras  e muitas enraizadas propagando sua espécime, entre muros e telhados. Isso me fez meditar que somos como árvores e passamos as fases de nossa vida, mudando de cor, aprofundando nossas raízes, criando brotos, balançando galhos, fazendo sombra e abrigando pássaros.

Enquanto a  paciência e a esperança aguardavam o start cirúrgico, saímos a procura de um lugar para um café. Encontramos um ambiente aconchegante no andar de cima de uma panificadora, com um buffet variado de doces e salgados. Entre os quais estava o "strudel de maçã", que a muito tempo desejamos comer, me lembrei de um versículo de Cantares de Salomão: 

"Sustentai-me com passas, confortai-me com maçãs, porque desfaleço de amor" (Cantares de Salomão 2:5). 

Percebi mais uma vez a mão do Senhor, nos confortando, naquele momento em que necessitávamos sentir o seu amor.

Voltamos ao hospital e ficamos aguardando... esse momento é cansativo e desgastante, parece que as horas são eternas, nos deparamos com cenas de tristeza e dor, rostos afadigados, semblantes sombrios, sirenes de ambulâncias, aglomerados vítimas de tragédias, gente chegando e gente saindo.

A paciência e a esperança continuavam lá, lado a lado, nos acalentando, quando derrepente após quatro horas e meia alguém entra na sala e nos chamam. Chegou a hora de vermos nosso menino, nosso guerreiro, que foi ferido em campo de batalha; mas não recuou, não deixou-se abater, não entristeceu seu semblante. Sempre triunfante, determinado e animado. Foi assim que o encontramos.

Seu lema é: "vai dar tudo certo."
Seu estandarte é o amor e disponibilidade em servir e ajudar o próximo, fazendo jus o significado do seu nome.

A noite poderia ficar apenas um acompanhante, num consenso fiquei eu.
Como a previsão era para ter alta do hospital no dia seguinte, ficamos num quarto tipo enfermaria com mais três pacientes. O ambiente era limpo e arejado, tinha uma poltrona na frente do leito para o acompanhante e um pequeno armário, onde pudemos acomodar nossas coisas. Não me importava se iria passar a noite ali com pessoas desconhecidas, estava feliz por estar junto do meu menino,  intercedendo por ele.

A noite é uma criança e passá-la em um hospital, são muitas as emoções...rss, mas enfim sobrevivemos.

Para finalizar, aproximadamente às 6 horas da manhã, ouvi bem próximo a janela do quarto, um pássaro novamente. Só que dessa vez ele cantou: "Bem-te-vi".


Juçara Silveira Santos - Imbituba 28/10/2014


2 comments:

  1. Que lindo!
    Não sabia que D.Juçara esscrevia tão poeticamente...
    Agora já sabes como ela de ter conquistado o seu Donizete, né? rs
    Beijão
    *Geise

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